
No sentido estrito, “gula” é uma palavra que classifica o vício de comer e beber em excesso. Substantivo muito conhecido pela nossa sociedade, é considerado um dos “sete pecados capitais”, termo que não está presente na Bíblia, mas foi muito utilizado pela igreja ao longo dos séculos para ajudar a reforçar os ensinamentos dos dogmas.
A Bíblia coloca, em Colossenses 3:5, o problema da gula na mesma lista de pecados como a prostituição, a avareza e a impureza, entre outros. Ou seja, comer sem controle é, sim, pecado.
Além disso, é possível que estejamos vivendo na época mais difícil para aqueles que lutam contra a gula. Não porque todos têm comida de sobra na mesa (até era para acontecer isso, já que o mundo produz comida suficiente para todos os habitantes), afinal, a desigualdade ainda mantém milhões de pessoas no mapa da fome. A provação vem do fato de que vivemos em uma era em que a moderação é ativamente desencorajada e a gula não necessariamente tem a ver só com a alimentação.
Equilíbrio e saciedade
Em nossa sociedade, estar satisfeito é quase um pecado. Você deve sempre querer mais, buscar mais, “viver mais” e por aí vai. Discursos feitos sob medida por marqueteiros geniais nos convencem que o jeito correto de viver é com essa ânsia por extrapolar os limites, inclusive aqueles que envolvem a comida. Na igreja, este tipo de discurso pode ser encontrado por trás de frases como “você é feito para reinar”, entre outras.
Mas a Bíblia não vai por este caminho, como vemos em João 6:
“Então Jesus declarou: “Eu sou o pão da vida. Aquele que vem a mim nunca terá fome; aquele que crê em mim nunca terá sede”. (v.35)
Ao proferir essas palavras, logo após ter realizado o milagre da multiplicação dos pães e dos peixes, obviamente Jesus não estava falando de modo literal. Essa figura de linguagem é utilizada para nos introduzir a outro conceito, cada vez mais abandonado pela sociedade e essencial para uma vida cristã sadia: a saciedade.
No dicionário lemos que saciedade é a “plena satisfação do apetite”, e, para nós, cristãos, o que o versículo de João apresenta é uma satisfação mais ampla, que preenche o coração e a mente, com a fé em Cristo (não a barriga).
O contraste desse conceito apresentado por Jesus com o que já demonstramos que a sociedade prega é evidente, e os cristãos precisam ser o grupo social que rompe com essa dinâmica, assim como nadamos contra a corrente em diversas outras frentes.
O povo do Domínio Próprio
Ficamos mal acostumados com as facilidades da rotina do mundo atual, e nos perdemos em vícios. Há compulsões de toda sorte na igreja: em sexo, em pornografia, em mexer no celular, em trabalhar, em comer, em beber… todas elas, de alguma forma, denotam gula (mesmo as que remetem a outros “pecados capitais”, como a luxúria): uma ausência de controle das vontades e a capacidade de ter domínio de seu próprio corpo.
O sinal de que algo está errado é tão forte que nos causa estranheza conhecer pessoas disciplinadas e capazes de dominar suas vontades, como aqueles que seguem planos alimentares restritos, fazem exercícios ou jejuns todos os dias, enfim.
Fato é, porém, que a Bíblia nos mostra que o domínio próprio é um dos frutos do Espírito (Gálatas 5:23) e, quando o assunto é comida e bebida, o livro de Provérbios é bastante duro:
“Não ande com os que se encharcam de vinho, nem com os que se empanturram de carne.
Pois os bêbados e os glutões se empobrecerão, e a sonolência os vestirá de trapos”. (Provérbios 23: 20 e 21)
Vemos, então, que a incapacidade de se satisfazer, também chamada de gula (tanto alimentar quanto em outras áreas das nossas vidas), é um sintoma de que nosso espírito está deficiente. Essa disfunção começa dentro de nós, no coração, e se manifesta fora, de várias maneiras diferentes.
Como combater a gula
Muito mais do que algumas gordurinhas acumuladas na barriga, os sinais de gula são muito evidentes. Alguns deles são incapacidade de descansar e admirar os feitos de Deus, ambição desenfreada que afeta outras áreas da vida, como a família, e por aí vai.
Para frear esse ímpeto, algumas atitudes são essenciais e podem ser tomadas de cara:
- Aumente seu tempo de busca por Deus: só Ele pode te saciar de verdade;
- Comece a valorizar as vitórias rotineiras: verá que já está avançando, e não precisa sair como um louco correndo atrás do vento;
- Conte com ajuda especializada: seja do seu pastor, terapeuta, professor de educação física ou nutricionista, há diversas pessoas abençoadas com diferentes dons para contribuir com um melhor equilíbrio da sua vida. Basta procurá-los.
No fim das contas, somos chamados a viver a plenitude do que Deus tem para nós, e alcançá-la não exige um esforço descomunal. Afinal, por mais que nos esforcemos, jamais conseguiríamos fazer o bastante. Precisamos buscar o Senhor e descansar nEle.
O mundo nunca vai te ajudar a vencer a gula. É interessante para ele que você esteja afundado nela. Mas Jesus venceu o mundo, e só isso nos importa.